28 de abril de 2012

CADERNETA DE POUPANÇA NO BRASIL, UM BREVE HISTÓRICO


De uma hora para outra, o debate no mercado sobre a política monetária não é mais apenas sobre como o Banco Central lida com a inflação. Com a Selic em 9% e ainda apontando para baixo, o debate passou a incluir a caderneta de poupança.

A poupança é um investimento bem simples. Paga uma taxa fixa de 0,5% ao mês – mais TR – a todo investidor, em qualquer banco, seja qual for o valor da aplicação (a idéia de se tributar saldos acima de R$ 50 mil surgiu em 2009, mas não vingou).

A taxa de 0,5% ao mês equivale a 6,2% ao ano, livre de impostos. Com a Selic apenas um pouco mais baixa do que o nível atual, a poupança passa a competir com fundos de investimento, possivelmente reduzindo a demanda por títulos públicos.

Na prática, portanto, a poupança define um piso para a Selic. Mesmo no nível atual, um fundo atrelado à Selic, dependendo da taxa de administração, já pode pagar menos do que a caderneta.

As ideias que têm surgido na imprensa para lidar com essa questão vão desde não fazer nada (já que a Selic pode não cruzar a barreira crítica ainda) até atrelar o rendimento da poupança à Selic, eliminando a TR. Fala-se, ainda, em uma solução provisória: reduzir a alocação da poupança ao crédito imobiliário, permitindo que os bancos comprem títulos públicos com recursos da poupança.

Há 150 anos, a poupança é sinônimo no Brasil de pé-de-meia simples e seguro. Por isso qualquer reforma é vista como tabu, especialmente se tocar no rendimento mensal de 0,5%. Em 2009, a proposta de tributação era justamente uma forma de lidar com essa questão, preservando a taxa de 0,5%.

Do Começo

Foi Dom Pedro II quem criou a Caixa Econômica da Côrte, em 1861, para “receber, a juro de 6%, as pequenas economias das classes menos abastadas”, com a garantia do governo. Os recursos eram usados para pequenos empréstimos. Em 1872, os “escravos de ganho” receberam permissão para abrir contas (em nome de seus donos). Em 1915, foi a vez das mulheres casadas – desde que o marido não se opusesse.

As regras sobre remuneração às vezes mudaram, mas a taxa de 6% continuou a ser a referência. Outras instituições de poupança foram criadas e, em 1915, o governo centralizou a fixação do rendimento. Houve tempo em que fixava taxas diferentes entre regiões do país.

Correção Monetária e Financiamento Imobiliário

Somente na década de 60 a poupança adquiriu papel importante no financiamento imobiliário. A correção monetária chegou em 1964. A partir daí, o poupador passou a receber a correção mais um juro “real” de 0,5% ao mês. E os bancos passaram a destinar 65% dos depósitos ao crédito habitacional.

No final da década de 80, por causa da inflação alta, a correção monetária passou de mensal a diária. As contas passaram a ter “aniversário” (todo mês, não todo ano). Todo dia, o Banco Central publicava um fator de correção para os próximos trinta dias. O sistema sobrevive até hoje. Desde 1991, o fator diário de correção é a TR – a Taxa Referencial.

A TR

No fim da década de 1980, a inflação galopante tornou a indexação pela inflação passada ineficaz. Surgiu como alternativa, em 1991, a TR.

A TR deriva, até hoje, de uma média diária de taxas de CDBs oferecidos pelos bancos, menos um redutor. Desde 1995, no entanto, deixou de acompanhar a inflação: mês a mês, nos últimos cinco anos a TR correspondeu a cerca de metade da variação do IPCA. A remuneração modesta levou os poupadores para os fundos de investimentos e para outras opções. Hoje, a caderneta representa 12% do M4. Era 40% no fim dos anos 80.

Reforma

A TR de 1991 e o regime tributário proposto em 2009 têm um traço comum: buscaram resolver um problema imediato, preservando a taxa mensal de 0,5%. Agora, em 2012, o governo pode fazer o mesmo, ou buscar uma solução mais duradoura.

As cadernetas de poupança e o financiamento imobiliário ainda têm ligação fraca com a política monetária no Brasil. Pode ser boa ideia dar-lhes mais proximidade. Não se trata apenas de criar espaço para o Banco Central cortar juros: uma reforma mais ampla poderia melhorar o arcabouço para o financiamento imobiliário, contribuindo para o crescimento sustentado do crédito.

POR GUILHERME DA NÓBREGA
(*) Economista do Banco Itaú Unibanco

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